Semeando a Psicanálise/ Franca
No IX Ciclo de Estudos do Curso de
Psicologia da Uni-FACEF.
Em 26/08/2015.
Psicanálise e Arte: as transformações do sofrer.
Ana Regina Morandini Caldeira
Penso que a arte deva ter
algum parentesco com a psicanálise, pois ambas têm a generosidade de oferecer-nos
chances de aproximação do que é impensável, também traduzem o indizível, e concedem
a possibilidade de suportarmos o que é doloroso.
Neste enfoque de
pareamento entre Psicanálise e Arte, faço a correlação de que a verdade que um
artista busca é principalmente sua verdade interior, assim como também, uma das
funções de grande importância da psicanálise seria o fato de colocar o
indivíduo em contato com ele próprio.
No transcorrer do Seminário
Teórico, tento estabelecer uma ligação entre parte da teoria de Bion, que diz
respeito às Transformações, e alguns
quadros de Frida Kahlo.
Ressalto os três tipos de emoção ou vínculos
básicos: L, H e K, no sentido de que há sempre uma articulação entre todo
processo de transformação com estes vínculos, notadamente o vínculo do
conhecimento. Sendo que este vínculo não diz respeito ao saber intelectual, mas
sim à busca das verdades.
Com referência à transformação em K, como algo relativo a um conhecimento sobre si
mesmo, a questão se dá no sentido se este conhecimento pode se tornar uma
sabedoria, isto é, se pode ser incorporado à vida como elemento transformador.
Podemos conjecturar que um dos
significativos sentidos da psicanálise, seria o de ajudar o analisando a
transformar sua relação com a própria mente inconsciente, constituindo o
advento de um novo sujeito. Gerando novos significados emocionais e permitindo
que ele possa se aproximar de si próprio, constituindo-se novas formas de
relação com ele mesmo e com o mundo.
Ao longo do processo analítico, cada
um de nós busca pela possibilidade de encontro com a própria verdade. Para
Bion, pensar é sonhar.
Faço a correlação entre a
arte e a psicanálise, no sentido do quanto podemos fazer uso delas para nos
depararmos com nossa essência.
A partir de uma seleção feita
com 10 quadros de Magdalena Carmen Frida Kahlo y Calderón - expostos durante a
apresentação do Seminário - observamos que ela pintava em suas telas um
autorretrato intimo, revelando suas dores físicas e psicológicas, numa
tentativa de entrar em contato com seus elementos internos. Disse assim: “nunca
pintei sonhos, pintei minha própria realidade”.
Nesta seleção, há uma
referência aos traumas vividos por Frida, ao longo de sua existência. Iniciados
principalmente com a falha da mãe como um escudo protetor, seguido pela
poliomielite, depois pelo gravíssimo acidente no bonde, sua vida turbulenta com
Diego, os impedimentos de levar adiante suas gestações, e a dolorosa
imobilização física nos anos finais de sua vida.
Sua vivência traumática
encontrou condição interna de dar formas à situação de dor a partir da pintura,
sendo capaz de resgatá-la da morte. Todo grande artista cria um mundo novo, pela
percepção de que seu mundo interno possa estar estilhaçado e necessita ser
recriado.
Escreveu em seu diário: “pés,
para que os quero, se tenho asas para voar”. O que seria de Frida se não
tivesse seu ofício, sua arte, seus quadros? Como será que conseguiria elaborar
suas catástrofes?
Talvez possamos sonhar
que o ser humano seja a única espécie que, ao longo de sua vida, vá construindo
asas para voar além do real, do palpável e do objetivo.
A concessão de vida é também
uma das funções da psicanálise! Através dela, temos o privilégio de construção
do recurso para elaboração de nossos reveses, gerando renovação e vitalização
interna. André Green diz que sua esperança, ao final da análise, seja de que seu
analisando esteja apto para aproveitar um pouco mais a vida do que podia antes
de procurar tratamento.
Que possamos usufruir da
vida e do que ela nos concede, a partir dos recursos que a Psicanálise e a Arte
nos oferecem!
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