sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Será que nascemos todos Pinóquios?



  Uma mulher de 40 anos entra na sala de análise com uma revista onde tem a figura de uma marionete e diz: - Esta sou eu!
Surge na mente da analista à história do Pinóquio, o boneco de madeira que sonha um dia, ser um menino de verdade e que pode ser também um modelo rico para pensarmos alguns fenômenos atuais da clínica psicanalítica.
Na ficcção, Pinóquio “nasce”, ganha “vida”, começa a ter movimentos independentes, mas continua uma marionete, mesmo sem a presença dos fios. Ele é constantemente influenciado pelos estímulos externos e internos, reage a eles sem a possibilidade de sonhar e pensar, sem possibilidade de ser de verdade.
Seria esta a nossa condição básica?
Nascemos com algumas características impressas como uma madeira que traz em si a história de sua constituição?
Somos muitas vezes manipulados e usados  pelo mundo interno e externo?
Acreditamos que somente no aprender com a experiência emocional, na relação viva com uma outra mente, é que nascemos enquanto ser psíquico e começamos a existir. Pinóquio tinha uma ânsia em se tornar logo um menino de verdade e pedia que a fada azul, magicamente, o transformasse em um.
Assim chegam nossos pacientes, procurando sentido, com ânsia de existência, mas muitas vezes esperando da “fada azul-psicanalista” uma transformação mágica e sem dor. Até mesmo porque ainda não entendem a diferença entre estar vivo e existir, entre ter pensamentos e pensar pensamentos.
A busca de saber quem somos de verdade e de transformações que nos aproximem do nosso eu verdadeiro, o mais humano possível, passa pelas experiências vividas e transformadas.
Nascemos todos Pinóquio, originalmente de matéria bruta, com pensamentos inconscientes nunca pensados, os quais aguardam a companhia de uma outra mente para pensá-los.
Pinóquio nasce desta matéria e durante seu percurso em busca do tornar-se um menino de verdade, passa por situações que muitas vezes eram definidas como mentira, seu nariz crescia e ficou conhecido como um personagem relacionado ao conceito da mentira.
Será que Pinóquio mentia, ou não sabia o que era ser de verdade?
Este é um questionamento importante para expandir nossa condição de acompanhar nossos pacientes em histórias que muitas vezes parecem criações fantásticas, imitações, estados alucinados. Mas que na realidade, são estados ligados ao impedimento de pensar. A verdade seria o impedimento de pensar do menino, que incapaz de pensar não pode se aproximar da verdade psíquica.
A personagem fada azul tem uma participação muito importante nesta história, ela inicialmente é uma figura idealizada que poderia transformar Pinóquio em um menino de verdade. Entretanto, durante toda a história ela será a mente continente que entra em cena e assume seu posto como precursora ou como facilitadora e promotora de desenvolvimento da mente incipiente do boneco. Oferecendo sua “varinha-função alfa”, ela é uma companhia viva na trajetória de Pinóquio no vir a ser um menino de verdade.
A partir destas idéias, as autoras fizeram uma reflexão sobre a relação entre Pinóquio e a fada azul, e a transformação de boneco em menino de verdade, traçando um paralelo com a relação analítica. Esta transformação , onde o paciente esta no processo de vir a ser mais plenamente e o analista esta conhecendo a pessoa que o paciente está se tornando através da experiência compartilhada e vivida entre paciente - analista - verdade.
Todos nascemos Pinóquio, com pensamentos e verdades que esperam companhia para torná-los toleráveis, possíveis de pensamento e existência. Desenvolver o aparelho de pensar, liberta a dor e percebemos que o desenvolvimento da condição de pensar os pensamentos  é um processo LIBERTADOR.
“A visão emocional compartilhada, vivencia-se uma sensação de estar com a verdade.” (Bion 1962/1994, p. 137).

Carla Cristina Pierre Bellodi (Membro filiado da Sociedade Brasileira de Psicanálise de Ribeirão Preto, Psicóloga)
Marta Maria Daud (Membro filiado da Sociedade Brasileira de Psicanálise de Ribeirão Preto, Psicóloga)

Trabalho Premiado em primeiro lugar no Congresso da OCAL(Organização dos Candidatos da América Latina) INTEGRAÇÃO, DIVERSIDADE E DESENVOLVIMENTO, em 03 de setembro de 2014, em Buenos Aires.
Leia este trabalho na integra na revista digital TRANSFORMACIÓN - http://t.co/bkIFJNGGnl

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