terça-feira, 23 de junho de 2015

Emily Atef
[Das Fremde In Mir, ALE, 2008]


Comentários: Denise Lopes Rosado Antônio – Psiquiatra e Psicanalista - Membro Efetivo da SBPRP.

O estranho em mim (Das Fremde In Mir, Alemanha, 2008), de Emily Atef, nos apresenta de modo delicado à dolorosa experiência de tomarmos consciência da complexidade do nascimento de um filho.

No início do filme Rebecca, a protagonista, na faixa de 30 anos, está grávida. Ela é uma mulher tranquila, vive um casamento amoroso com Julian, tem prazer em seu trabalho e está feliz à espera de seu primeiro filho.  As circunstâncias nos levam a crer que o nascimento do filho irá transcorrer tranquilamente, que veremos as cenas clássicas da chegada de um bebê e a relação amorosa entre mãe e filho.

Berthe Morisot - The Cradle – 1872


O encantamento começa a desaparecer a partir da experiência dolorosa de Rebecca ao passar pelas dores do parto. Ocorre o nascimento do filho, ele é apresentado à mãe, porém ela já se encontra imersa num outro estado mental. Num estado mental de indiferença, de distanciamento. Rebecca não consegue receber seu bebê com aquele amor esperado por ela e por todos nós. Rebecca o recebe com sentimentos de estranheza.

Segundo Winnicott, quando o bebê está no útero, a função da mãe consiste em proporcionar um meio que lhe dê tempo para amadurecer, para vir a enfrentar a inevitável tarefa da separação física que se dará ao nascer. E, em continuidade, essa função, logo após o nascimento, levará a mãe e o seu bebê a formarem uma nova entidade composta por mãe-bebê, onde um aspecto da mãe está misturado com seu filho gerando um estado emocional à mãe que ele chamou de “preocupação materno primária”. É uma vivência de sentir-se no lugar do bebê, isto é, perder-se a si mesma e compor-se como uma parte dessa nova entidade chamada mãe-bebê. Se nenhum aspecto da mãe for sentido como uno ao bebê, se não existir nenhuma identificação, este será vivenciado como um objeto estranho.


          
        Essa pintura da Frida Kahlo, “Minha ama e eu”,  é uma imagem que choca por nos apresentar uma relação fria, distante. Nela, a amamentação acontece; porém, a relação afetiva entre mãe-bebê não está presente. Eles são elementos estranhos um ao outro. O bebê tem que amadurecer à duras penas, suas reações serão de choro intenso, irritabilidade e dificuldades para dormir.  


O filme transcorre sob esse clima de estranheza entre mãe-bebê, entre marido-mulher, refletindo em todos os familiares.  Ele nos apresenta ao que a Psiquiatria denomina Depressão Pós-Parto, e nos mostra com delicadeza as consequências e a importância dos  cuidados com a mãe, com o bebê e com o casal . A chave da saída desse estado da mãe, pai, e bebê está na base da personalidade dos nossos protagonistas, E que vem a ser o sentimento amoroso.  

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